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Letra de Forma

"A crítica deve ser parcial, política e apaixonada." Baudelaire

Letra de Forma

"A crítica deve ser parcial, política e apaixonada." Baudelaire

Ouro, prata, lata

 

Nuno Ferreira Santos – “Público”
 
 
 
O primeiro-ministro José Sócrates será pois O Menino de ouro do PS, título da biografia de Sócrates pela jornalista Eduarda Maio, que contou com a apresentação de António Vitorino e Dias Loureiro (como poderia ter sido de Jorge Coelho e Ângelo Correia). É pois em coerência que tem um assessor para a cultura que se apresentou como emblemático de uma Idade da Prata. A “lata” é que também não é pouca.
 
 
 

 

Crítico excelentíssimo

 

 

Foi notada a recente edição pelo Instituto Camões, instância pública de difusão internacional da cultura portuguesa, de (mais) uma publicação de Alexandre Melo, Arte e Artistas em Portugal. O autor é apresentado como licenciado em economia e doutorado em sociologia, crítico de arte, organizador de exposições, autor de diversos livros e também curador das colecções do Banco Privado (em depósito em Serralves) e Ellipse Foundation. Como é sumamente sabido, embora não referido na algo modesta apresentação de um autor que acumula tantos papéis, ele é também assessor cultural do Primeiro-Ministro José Sócrates. Dirá o autor (e de resto já o tem dito) que apesar da data recente da publicação, ocorrida durante a presidência portuguesa da União Europeia durante o segundo semestre do ano passado (facto aliás expressamente assinalado numa nota introdutória do Ministro dos Negócios Estrangeiros, Luís Amado), a encomenda data já de 2001, quando o director do Camões era Jorge Couto, e não quando Melo já exercia o seu actual assessorado.
 
Em rigor, pouco importa isso, pois se confirma a proximidade de Melo a uma zona de poder com conotações partidárias, PS no caso (de resto, sendo novamente governo o PS, como o era ao tempo da encomenda, também o responsável pela encomenda, Jorge Couto, está de novo num alto cargo cultural público, a direcção da Biblioteca Nacional), e que o autor do livro, para além das funções que presentemente exerce junto do primeiro-ministro, continua “apresentável”, como curador de colecções privadas, e a esse nível interveniente também em instâncias que são ao mesmo tempo de “consagração” e de “mercado”.
 
Seja qual for a perspectiva, artística, sociológica, política ou ética, torna-se patente que Alexandre Melo é um “case study” de acumulação de competências e papéis – que até eventualmente poderia no âmbito académico ser objecto de uma análise, não sem o risco de ainda vir a ter como arguente ou director do júri o mesmo Alexandre Melo, tais as promiscuidades instaladas.
 
É uma tal abordagem da arte a altos níveis do Estado, com competências sobrepostas e na institucionalização das promiscuidades, um caso crítico, ético e político que cristaliza um entendimento do “Estado da Arte” – sem qualquer regulação de instâncias de regulação. É uma intervenção nos “mundos da arte” que configura uma “dominação” e uma legitimação directa a partir de instâncias centrais do poder político, em violação das normas abertas no espaço público. E que por inteiro, creio, justifica que obstinadamente se continue a chamar a atenção para um sistema gravosamente enquinado…
 
 
 
 
“Crítico excelentíssimo” é o título de novo texto na coluna “O Estado da Arte” em www.artecapital.net , prosseguindo a reflexão “Estado da arte – arte do Estado?”.
 
 
Nota – A propósito de promiscuidades, “arte do Estado” e outras questões: a série PortugALL S.A. – As colecções de Manuel Pinho prosseguirá, tanto mais que agora abriram as exposições por ele desejadas no Allgarve.

 

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