Cantatas de Bach - III
Bach
Cantatas
Vol. 23 – Cantatas BWV 159, 67, 42, 158 (cd 1), 104, 85, 112 (cd 2)
Gillian Keith, Daniel Taylor, Charles Daniels, Stephen Vercoe ( cd 1)
Katharine Fuge, William Towers, Norbert Meyn, Stephen Vercoe (cd 2)
Vol. 3 – Cantatas BWV 24, 185, 177 (cd 1), 71. 131, 93, 88 (cd 2)
Madgalena Kozená, Nathalie Stutzman, Paul Agnew, Nicholas Teste (cd1)
Joanne Lunn, William Towers, Kobie van Rensburg, Peter Harvey (cd 2)
Vol. 25 – Cantatas BWV BWV 86, 87, 97 (cd 1), 44, 150, 183 (cd 2)
Katharine Fuge, Robin Tyson, Steve Davislim, Stephen Loges (cd1)
Joanne Lunn, Daniel Taylor, Paul Agnew, Panajotis Iconomou (cd2)
Monteverdi Choir, English Baroque Soloists, John Eliot Gardiner
Cds Soli Deo Gloria, dist. CNM
Como se sabe, a integral das cantatas litúrgicas de Bach por Gardiner, em curso de edição, é o registo de um projecto único na sua desmesura: em 2000, nos 250 anos da morte do compositor do compositor, mais exactamente desde o dia de Natal de 1999, Gardiner e os seus músicos efectuaram uma peregrinação que não se limitou aos locais que tinham sido os do compositor, na Turíngia e na Saxónia, mas foi mais vasta, tendo inclusive passado pelo Porto, e concluindo-se em Nova Iorque.
As cantatas foram interpretadas no dia do calendário litúrgico a que se destinavam, e esse acto foi, diz Gardiner, a “raison d’être” do projecto. Mesmo que novos dados de edição tenham sido utilizados, não se tratou de maneira nenhuma de um projecto eminentemente musicológico – aliás, desde logo, e ao contrário dos princípios filológicos admitidos, Gardiner sempre usou coro misto, o seu Monterverdi Choir, nas interpretações bachianas.
Gardiner pretendia também captar a emoção de um concerto, mesmo que por razões de segurança as gravações fossem de facto efectuadas imediatamente antes – supondo-se contudo que o fulgor de uma noção de urgência ficasse registado. Mas um tal desmesurado projecto foi – e é no seu eco discográfico – forçosamente irregular, desde logo pela constante mudança de solistas. Acresce que, como podemos verificar, a qualidade das gravações em si mesmas não é brilhante.
Quem não esteve pelos ajustes foi a editora na qual Gardiner era no entanto uma das cabeças de cartaz, a DG/Archiv: alguns volumes ainda saíram com esse selo, mas depois veio a ruptura e Gardiner criou a sua própria editora, Soli Deo Gloria. Mas, já agora, também não se percebe muito bem a ordem de publicação dos volumes, como se pode verificar pelos presentes.
O vol. 23 reúne cantatas para o Primeiro Domingo depois da Páscoa, Nach dir, Herr, verlanget mich, BWV 150, Halt im Gedächtnis Jesum Christ, BWV 67, Am Abend abr desselbigen Sabbats, BWV 42 e Der Firied sei mit dir, BWV 158, e para o Segundo Domingo Depois da Páscoa, Du Hirt Israel, höre BWV 104, Ich bin ein guter Hirt BWV 85 e Der Herr ist mein getreuer Hurt, BWV 112; o vol. 3 cantatas para o Quarto Domingo depois da Trindade, Ein ungerfärbt Gemüte BWV 24, Barmherzigges Herze der ewigen iebe BWV 185 e Ich ruf zu dir, Herr Jesu Christ BWV 177 e para o Quinto Domingo Depois da Trindade; Gott ist mein König BWV 71, Aus der Tiefen rufe ich, Herr, zu dir, BWV 131, Wer nur lieben Gott lässt walten, BWV 93 e Siehe, ich will viel Fischer aussenden BWV 88; o vol. 25 cantatas para o Quinto Domingo Depois da Páscoa, Wahrlich, wahrlich, ich sage euch BWV 86, Bisher habt ir nichts gebeten in meinen Namen BWV 87, In allen meinen Taten, BWV 97, e para o Domingo depois da Ascensão, Sie werden euch in den Bann tun I, BWV 44, Nach dir, Herr, verlanget mich, BWV 150 e Sie werden euch in den Bann tun II e ainda um moteto de Johan Christoph Bach (primo) Fürchte dich nicht.
Por esta altura da peregrinação, em termos discográficos, as características estão já suficientemente definidas, e dir-se-ia que o termo que o termo que ocorre é o de "graciosidade", mesmo de certo modo “brilhantismo”, mas em modos mais profanos que em rigor litúrgicos: Gardiner está no seu melhor em cantatas festivas como a BWV 71, no vol. 3, sempre que o ritmo é de dança, ou nos coros fugados. Paradoxo maior para um projecto de cantatas, são as cores dos English Baroque Soloists que sobressaem, às vezes os oboés, outras as flautas, outras ainda, mais raras, as trompetes, mesmo nalgumas ocasiões as cordas, e imagine-se que no Monterverdi Choir as vozes femininas, filologicamente desajustadas, se sobrepõem às masculinas.
O vol. 3 é um dos melhores já publicados e não necessariamente pelos nomes mais sonantes de solistas – de facto Kozená até se apresenta com falta de fôlego e Stutzman com algumas inflexões amaneiradas, embora sempre impressionante de timbre. Mas há um notório dramatismo e esplendor, sobretudo na BWV 24, os tenores Agnew e Von Rensburg são pertinentes e o baixo Harvey mesmo eloquente.
Em contrapartida, o vol. 23, pesem ainda os belos momentos do cd 1, como os coros finais da cantata BWV 150, ou as interpretações do baixo Stephen Vercoe ao longo do volume, é arruinado pela flagrante mediocridade do contratenor Norbert Towers e do tenor Norbert Meyn no cd 2.
São ainda os desequilíbrios dos solistas que marcam o vol. 25, no cd1, com uma sofrível soprano, Katharine Fuge, e um surpreendente tenor (e surpreendente neste reportório), Davislim, no cd 1, enquanto no 2 Daniel Taylor e Agnew são excelentes.
Tudo ponderado, o vol. 3 é das melhores introduções às características desta integral de Gardiner.