O concurso público da Gulbenkian - II
Com a sua habitual morosidade, a Gulbenkian anunciou finalmente a nomeação de um novo director do Serviço de Música, processo iniciado em Fevereiro, e referido em Maio aqui e aqui. Dir-se-á que num tal concurso internacional é necessário uma cuidada ponderação, mas também por mim acrescento que há dois meses que sabia que a decisão estava tomada e o perfil do escolhido. Com a habitual discreção da Gulbenkian o anúncio oficial é o constante aqui.
É pois o finlandês Risto Nieminen (na imagem), actual director do Festival de Helsínquia, que foi nomeadamente administrador da Orquestra Sinfónica da Rádio da Finlândia, director artístico do IRCAM (Institut de Recherche et Coordination Acoustique/Musique) do Centro Georges Pompidou, em Paris, e que integrou
a Direcção da Associação Europeia de Festivais, que em Abril de 2009 substituirá o actual director, Luís Pereira Leal - que ao longo de três décadas conduziu o Serviço de Música a níveis de excelência ímpares no país, em qualquer campo artístico e cultural. E é uma escolha que, à priori, se afigura justificada.
a Direcção da Associação Europeia de Festivais, que em Abril de 2009 substituirá o actual director, Luís Pereira Leal - que ao longo de três décadas conduziu o Serviço de Música a níveis de excelência ímpares no país, em qualquer campo artístico e cultural. E é uma escolha que, à priori, se afigura justificada.
A invulgaridade da situação em Portugal, bem como o facto de durante anos ter sido expectável uma solução simplesmente sucessória, ou dinástica, com a passagem de testemunho, ao director-adjunto, Rui Vieira Nery, justificam alguns comentários.
Em primeiro lugar, e como princípio geral, acho preferíveis os concursos públicos – e no caso da Gulbenkian, como já o disse, espero que o mesmo venha a suceder no ora moribundo Centro de Arte Moderna. Sou evidentemente favorável a tal princípio nas grandes instituições públicas e de parceria público-privado, e se bem que saiba ser difícil (não só em Portugal) a tutela prescindir de se implicar na nomeação dos directores dos teatros nacionais, entendo que, como de resto está previsto no programa do actual governo (mas também neste caso sem efeito), o governo deve sim nomear as administrações que depois encetariam o processo de escolha do director artístico.
Acresce que justamente o grande nível de programação da Gulbenkian mais justifica uma escolha nestes moldes. Mas sucede também que são muitas as rotinas, que os públicos não se renovam (é-me aflitivo ir aos concertos e continuar quase só a ver as mesmas pessoas de há 30 anos), que há que encontrar outras formas de programar – e, de um modo geral, uma perspectiva vinda do exterior, um olhar novo, pode ser muito benéfico, no caso tanto mais quanto os nórdicos têm usualmente uma experiência de organização diversificada de concertos.
Se essas são as razões fundamentais, terei ainda de dizer, com toda a admiração intelectual e grande amizade, que Rui Vieira Nery não me parecia ter o perfil adequado para suceder a Luís Pereira Leal, por três ordens de razões: 1) dificuldades executivas, como as que se evidenciaram na sua passagem pela secretaria de Estado da Cultura; 2) menos interesse e conhecimento numa área de grande lastro da Fundação e em que esta não pode deixar de se manter uma entidade importante (embora, espera-se bem, com menos favoritismo a Emmanuel Nunes), a música contemporânea, área em que pelo seu perfil, designadamente no IRCAM, Nieminen apresenta todas as garantias; 3) enfim, como já fiz notar, até porque a área de programação directamente a seu cargo, a de música antiga, era nos últimos anos a que se vinha apresentando mais burocrática na programação geral, o pior sendo mesmo a presente temporada, em que é por inteiro dedicado à música no Brasil colonial, opção temática que faria toda o sentido quando havia ainda as Jornadas de Música Antiga, mas é muitíssimo limitativa no quadro de toda uma temporada. Mas espero também que o saber e as enormes capacidades intelectuais de Rui Vieira Nery possam no futuro traduzir-se em algo de mais substancial que a “prateleira” à “boa maneira” da Gulbenkian que entretanto lhe arranjaram, um Programa de Educação pela Arte.
Entretanto aguardemos auspiciosamente Risto Nieminen e, quando for ocasião, presta-se a Luís Pereira Leal a devida homenagem de reconhecimento.