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Letra de Forma

"A crítica deve ser parcial, política e apaixonada." Baudelaire

Letra de Forma

"A crítica deve ser parcial, política e apaixonada." Baudelaire

Takeshi Kitano - I

 

 

 

Polícia Violento (1989)

Sonatina (1993)
Dvds Prisvideo
 
 
 
 
Bem-Vindo, Kitano-San!
 
 
Takeshi Kitano é um dos mais importantes autores recentes japoneses, totalmente  desconhecido em Portugal, a não ser pela sua participação, no papel do Sargento Hara, em Furyo  de Nagisa Oshima, cujo título internacional era uma frase por ele pronunciada: Merry Christmas Mr. Lawrence.
 
Actor e"entertainer" televisivo, Kitano atingiu a celebridade nos anos 70, como parte de um duo, os “Beats” -  “Beat” Takeshi é o nome pelo qual continua a ser reconhecido pelo público japonês. Mas em 1989 Kitano haveria de surpreender tudo e todos com The Violent Cop, filme  por ele protagonizado e dirigido, espécie de Dirty Harry/ Clint Eastwood japonês, obra de uma surpreendente mestria, em que o género de filmes de gangsters, dos yakusa japoneses, era o veículo para um relato de auto-destruição.
 
Se Kitano, ainda que operando dentro de uma tradição japonesa, tinha como parentes cinematográficos não só Eastwood como Jean-Pierre Melville (será um acaso que o mais importante título do realizador francês, Le Samourai, tivesse uma referência japonesa?), os sucessivos filmes mostrariam uma cada vez maior auto-destruição da sua "persona", como em Boiling Point, abstendo-se mesmo de aparecer em A Scene at the Sea, filme praticamente sem palavras, tendo como personagens principais dois adolescentes surdos-mudos.
 
Mas a reapropriação/descontrução mais admirável dos códigos dos filmes de yakusa ocorreria com Sonatina, em que a personagem de Kitano é conduzida ao suicídio. Como Eastwood, Kitano é um grande actor/autor que, trabalhando dentro das regras da indústria, soube afirmar uma personalidade fortíssima. Laborando dentro dos códigos de géneros específicos faz implodi-los. Talvez por isso Quentin Tarantino considere que ele e Kitano têm uma comum aproximação ao cinema.
 
 
Publicado no Catálogo do Festival Monumental-95
 
 
 
Takeshi Kitano foi um dos autores que tive a oportunidade de introduzir em Portugal, sempre no pressuposto de que a actividade crítica pode prosseguir na programação, que ao crítico cabe também “descobrir” e, tanto quanto possível, tentar apresentar concretamente em público as suas escolhas, ser “le passeur”, como dizia Serge Daney.
 
Se Kitano se veio depois a tornar-se mesmo num “autor de culto”, esses dois filmes nunca vieram, no entanto, a ser estreados comercialmente. Passados 12 anos, eis que são enfim editados em dvd pela Prisvideo, aliás pouco tempo depois de uma outra edição, da Midas, com A Scene at the Sea/ Um Lugar à Beira-Mar e Getting Any/ Estás-te a Safar?, este já desse mesmo ano de 1995.
 
Com o posterior e fabuloso Hana-Bi, permanecem ainda estes primeiros filmes como os seus melhores – e são também uma declaração ética.
 
À falta da visão em sala, que é o espaço constituinte do cinema, possibilitam todavia os dvds a revisão, quando não às vezes mesmo a descoberta. E se Takeshi Kitano tem recentemente podido aparecer cada vez mais como um autor “cansado”, num exercício constante da auto-derisão que já se confunde com a mera paródia de si próprio, estes primeiros filmes eram já a declaração de uma estética de “haiku” cinematográfico, entre o confronto violento e do silêncio.